6 de agosto de 2013

Deputado federal preso se apega a livros religiosos na penitenciária

Brasília - Três dias após se entregar a policiais federais em um ponto de ônibus de Brasília, no fim de junho, o deputado federal Natan Donadon (RO) recebeu, no Complexo Penitenciário da Papuda, sua primeira visita no cárcere.
Uma comitiva de funcionários da Câmara tentava notificá-lo do início do processo de cassação de seu mandato.Já sem o terno, a gravata e o broche de metal dourado banhado a ouro que identifica os deputados --seu traje quando se entregou--, ele vestia camisa e bermudas brancas, padrão da penitenciária.
A exatos 17 km do gabinete de 36 m² com computadores, poltronas e TVs que ocupava na Câmara, Donadon ouviu as explicações da notificação por meio de uma pequena abertura que, na sala a que foi conduzido, permitia que se comunicasse com a visita.
Pouco depois, voltou à cela individual de 6 m² com cama, sanitário e chuveiro, na ala apelidada "Cascavel".
O setor abriga internos considerados perigosos, daí o apelido, ou que por algum motivo não podem se misturar. Um congressista preso seria certamente alvo de achaques e agressões, dizem familiares e advogados dele.
"O que aparentemente é uma regalia acaba sendo um castigo maior ainda. Como diz a música do Alceu Valença, 'a solidão é fera/a solidão devora'", diz Cleber Lopes, um dos advogados do empresário Carlos Cachoeira, que passou 266 dias numa cela individual da penitenciária.
A Papuda diz que a cela individual decorre do status de deputado. Status esse que está prestes a ser removido.
Bode expiatório
O paranaense Natan Donadon, 46, está em seu terceiro mandato como deputado federal, mas sempre pertenceu ao chamado "baixo clero".
A modesta carreira contrasta com o fato de, desde 28 de junho, ser o primeiro congressista-presidiário pós-ditadura militar. Condenado pelo Supremo Tribunal Federal a mais de 13 anos, ele deve ficar em regime fechado pelo menos até setembro de 2015.
Sua condenação se deu sob a acusação de ter desviado R$ 8,4 milhões da Assembleia de Rondônia por meio de contratos de publicidade fraudulentos. Seus advogados tentarão diminuir a pena em um processo de revisão criminal.
"Houve violação ao princípio da isonomia. Acusados pelos mesmos crimes foram condenados a penas muito menores", afirma um dos advogados, Nabor Bulhões.
A mulher de Donadon, Rosângela, pede que a justiça seja feita. "Como estavam ouvindo as vozes das ruas, como tinham que dar uma resposta à sociedade, pegaram ele como bode expiatório. O processo do mensalão não teve nenhum condenado com uma pena dessa [na verdade,cinco réus do mensalão tiveram pena superior], daí já se vê o disparate", diz ela, que o visita todas as quartas.
Rosângela nega que ele tenha se abatido e diz que o deputado, que é evangélico, passa o tempo lendo a Bíblia e o livro "Deus Trabalha no Turno da Noite", do pastor da Igreja Quadrangular Ron Mehl (1944-2003), que traz mensagens de conforto.
Congressistas afirmaram ter ouvido relatos de que presos de celas vizinhas têm submetido Donadon a terrorismo psicológico, gritando ameaças, o que a mulher e a defesa dizem não ter ouvido dele.
O congressista não tem recebido visitas de políticos, foi expulso do PMDB, teve cortados o salário de R$ 26,7 mil, as verbas e os funcionários.
As portas do gabinete 239, onde ainda está a placa com seu nome e a bandeira de Rondônia, ficam trancadas.
Até os ex-aliados dizem que ele será cassado ainda neste mês. Diante desse clima, seu suplente, o ex-ministro Amir Lando (PMDB-RO), foi à Câmara há algumas semanas tentar assumir de uma vez a vaga. Foi convencido a esperar a cassação do colega.
Faltas
Para Natan Donadon ser cassado, será preciso o voto de ao menos 257 de seus 512 colegas deputados.
Caso a cassação não ocorra nessa fase, a Câmara irá tirar seu mandato por faltas --a Constituição prevê essa medida quando as ausências superam um terço das sessões do ano. Ele já faltou em 15,8%.
Com isso, Donadon deve ser o 18º deputado a ter o mandato retirado pelo plenário da Câmara desde a Constituição de 88 --na lista está, por exemplo, o ex-ministro José Dirceu (PT), condenado no mensalão.

Fonte: Folha de São Paulo

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