Veículo da força nacional de segurança foi incendeado |
O
clima é de medo e tensão na vila Rio Pardo, no interior da APA
(Área de Proteção Ambiental) - desmembrada da Floresta Nacional
(Flona) do Bom Futuro – onde, na última semana, manifestações
populares culminaram na morte do policial da Força de Segurança
Nacional Luiz
Pedro de Souza dos Santos.
De
acordo com o secretário municipal de Agricultura (Semagric), Leonel
Bertolini, nove pontes foram danificadas durante o conflito,
impedindo o transporte de estudantes e de produtos agrícolas. A
produção local de leite é de 26 mil litros e sem condições de
comercialização, o produto está sendo jogado fora, afirma ele.
O
vereador da Capital Jurandir Bengala pernoitou em Rio Pardo na noite
de sábado para domingo e fez um pronunciamento na Câmara na última
segunda-feira (18), pedindo apoio à população. “Tem marcas de
tiros em casas comerciais e no posto de gasolina. Além de pessoas
com marcas de bala de borracha no rosto e nos braços. Mas ninguém
fala, com medo de represálias”, disse Bengala.
De
acordo com a assessoria da Secretaria Estadual de Segurança Pública,
a "situação está sob controle na região".
Para
o vereador Jurandir Bengala, o conflito ocorrido em Rio Pardo foi
provocado por medidas adotadas pelo Governo do Estado. Ele relata
que, no processo de desmembramento da área da APA da Flona - quando
foi feito um acordo entre os governos federal e estadual para
desmembrar a área da APA que se encontrava ocupada - da Flona,
ficaram fora do acordo cerca de 40 famílias que estavam na área.
Em setembro de 2012, elas foram retiradas da Floresta Nacional e, de
acordo com o vereador, teriam sido levadas para lotes que
posteriormente foram reivindicadas por um fazendeiro, sob alegação
de que seria o "proprietário" da terra. Os agricultores
foram, então, retirados e o governo passou a pagar um salário
mínimo para os mesmos, com a promessa de providenciar outro lugar
para reassentamento.
Segundo
informação de moradores repassadas ao vereador, o local onde
estavam os agricultores hoje é ocupado por uma fazenda com 2 mil
cabeças de gado. Este fato, mais a demora de quase um ano sem uma
definição para o impasse, incentivou 10 famílias remanejadas a
retornarem para dentro da Flona e com elas outras pessoas que não
tinham nada a ver com a questão também invadiram. "Tinha
gente de Jaru, Ouro Preto e outros municípios", afirma o
vereador.
O
Diário procurou a Secretaria
de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam)
para confirmar as informações, mas até o fechamento da edição
não obteve resposta.
Prisões
revoltam moradores
Na
última quarta-feira (13), o Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) fizeram uma ação de reintegração de posse na Flona e
prenderam 10 pessoas que se negavam a sair. Os policiais que apoiavam
a operação entraram na vila com os presos, e houve uma manifestação
popular. Os prédios recentemente construídos para a Polícia
Militar e a Sedam foram depredados.
Na
quinta-feira, um grupo danificou a ponte de acesso ao local e impediu
a entrada de um comboio de três viaturas da Força Nacional de
Segurança na entrada da vila de Rio Pardo.
Depois
de consertar a ponte, os policiais prenderam dois homens, apreenderam
duas motos e entraram na vila com os presos, quando um grupo de
pessoas atacou o comboio com o objetivo de resgatar os dois detidos.
Com a negativa de soltura dos presos, aproximadamente 300 pessoas
encurralaram os policiais atirando paus, pedras e coquetéis molotov.
No confronto, a polícia usou balas de borracha para dispersar a
multidão. Uma viatura foi incendiada e explodiu. Na ocasião, o
soldado Luiz Pedro de Souza Gomes, de 33 anos, perdeu a vida. Uma
primeira versão indica que ele foi atingido por uma arma da própria
polícia que teria sido acionada acidentalmente, atingindo o rapaz no
braço e chegando até o pulmão, embaixo do colete de proteção de
balas. Os dois presos que estavam sendo escoltados pelos policiais,
teriam fugido.
Operação
policial para desarmamento
Na
sexta-feira (15), um comboio policial com mais de 30 viaturas foi
enviado para o local de conflito com o objetivo de acalmar os ânimos
e desarmar os moradores. Um rapaz foi preso porque teria uma arma de
calibre 38 e outros objetos considerados suspeitos em casa. Os
moradores alegam que ele não tinha nada a ver com o conflito. Um
dentista que teria recolhido armas e munições deixadas pelos homens
da Força de Segurança Nacional teve a casa invadida no momento em
que estava ausente. Os policiais teriam provocado estragos no
gabinete odontológico e atirado contra as paredes da casa.
Direitos
humanos
Com
as notícias do conflito, uma equipe formada por representantes da
Comissão Pastoral da Terra (CPT), Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB) e Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos (Cebraspo)
esteve na vila de Rio Pardo para verificar denúncias de torturas
contra moradores do local.
De
acordo com a coordenadora regional da CPT, Maria Petronila Neto,
foram colhidos depoimentos e registros fotográficos de pessoas
feridas com balas de borracha. E constatadas marcas de tiros em
casas, estabelecimentos comerciais, posto de gasolina e na casa de um
dentista.
Ela
explica que a comissão só esteve na região para verificar a
violação de direitos e não a questão fundiária da região.
Petronila afirmou que a comissão permaneceu pouco tempo na região,
por isso prefere não se pronunciar sobre quem são as pessoas que
participaram dos confrontos.
Ela
acredita que "grupos independentes", assim chamados porque
não fazem parte de organizações mais conhecidas, como o MST
(Movimento dos Trabalhadores Sem Terra), buscam terras na região. Em
Porto Velho, a Comissão está acompanhando a situação dos presos.
Estão previstas denúncias em órgãos de defesa de direitos humanos
no Brasil e no exterior. "O governo precisa tomar medidas que
garantam paz e tranquilidade para os moradores locais", cobra a
representante da CPT.
Área
boa para atividade agrícola
O
vereador Bengala informa que em levantamento recente feito na região
da vila de Rio Pardo foram contabilizadas 2.513 casas, englobando as
áreas urbana e rural. Com o cálculo de uma média de quatro
moradores por casa. Ele afirma que mais de 10 mil pessoas vivem na
região. Grande parte deles são provenientes de estados que têm uma
cultura de produção agrícola. O solo é fértil e a água,
abundante e Rio Pardo é considerado como um dos maiores produtores
de alimentos da Capital.
Segundo
o secretário municipal de Agricultura, Leonel Bertolini, a produção
de café no ano passado foi de 32 mil toneladas e por dia são
produzidos 26 mil litros de leite. Também há uma produção de gado
de corte, além de banana, macaxeira e outros produtos.
As
condições propícias de produção agrícola incentivaram a invasão
da Flona do Bom Futuro. Uma reserva federal criada em 1988, para o
uso sustentável de recursos florestais e pesquisa científica. No
final da década de 1990, a unidade começou a ser invadida, com o
apoio de governantes, parlamentares, prefeitos, grileiros e
madeireiros. Em 2003, quando já havia cerca de 5 mil pessoas e 40
mil cabeças de gado dentro da Flona, o Ibama organizou uma grande
operação para a retirada dos invasores e foram fechadas oito
serrarias.
Em
dezembro de 2004, foi montada outra grande operação, que deveria
iniciar com a retirada do gado. Houve resistência e a operação
foi abortada. Em 2008, uma nova operação também não deu em nada.
Em 2009, o então governador Ivo Cassol firmou um compromisso com o
Governo Federal para o desmembramento de uma área de 170 mil
hectares da Flona, em troca de área semelhante na Reserva Rio
Vermelho, destinada para a construção da Usina Hidrelétrica de
Jirau. Com isso, foi formada a APA Rio Pardo, que ficou sob a
responsabilidade do Estado de Rondônia.
Restrições
ambientais
A
produção na APA de Rio Pardo - que ainda não é um distrito,
conforme vem sendo divulgado na mídia – é pontuada por uma série
de restrições ambientais. Leonel Bertolini afirma que terá que
entrar em entendimento com o Ibama e o ICMBio para derrubar árvores
para o conserto das nove pontes danificadas durante os conflitos que
ficam dentro da Flona.
Em
entrevista coletiva na última sexta-feira, o secretário estadual de
Segurança, Marcelo Bessa, admitiu a possibilidade de atuação de
madeireiros e grileiros na Floresta Nacional do Bom Futuro, que
estariam retirando madeira ilegal da área e também influenciando os
moradores contra os agentes de órgãos ambientais e de segurança.
Texto: Ana Aranda (Diário da Amazônia)
Foto: Buritisnews
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